segunda-feira, 17 de agosto de 2009

crônica: O BÊBADO E A MARIA DA PENHA

Rubens Antônio da Silva

O que aconteceu foi mais ou menos assim. O marido bebeu além da conta. Chegou em casa bancando o valente. A mulher, deficiente de uma perna, ficou perturbada em sua cadeira de rodas. Sabia que ele ficava assim quando bebia. Mas agora ele estava exaltado demais. O netinho pequeno e filha da vizinha ali presentes ficaram um tanto assustados. E o homem gritava, batia na parede, batia nos móveis, quebrava pratos. “Hoje eu mato alguém”, bradava. “E é você, mulher!”. Olhava pra ela e se apoiava na parede, as pupilas dilatadas. “Chamem a Polícia, senão vou matar você. Com oitenta facadas. Oitenta facadas! Chamem a Polícia!”, ele mesmo rosnava assim, cambaleando. “Eu pego essa mulher, eu enforco ela. Eu pego, eu enforco. Chamem a Polícia!” A mulher perdeu a paciência: “chamem a Polícia!”, pediu. Alguém chamou. O bebum ainda repetia aquelas mesmas palavras quando o carro policial parou à frente da casa. Prisão em flagrante. A Cadeia de Porangaba deixou más lembranças.

O Ministério Público manifestou dizendo que o homem poderia responder em liberdade, sem pagamento de fiança. Não tinha antecedentes. O magistrado deferiu. O homem foi solto. Em vez de mantê-lo recolhido, o juiz determinou que ele posto pra fora... até de sua casa. Medida Protetiva da mulher: artigo 22 da Lei Maria da Penha. Estava proibido de voltar para casa e de se aproximar da família.

Chegou o Oficial de Justiça. A mulher atende, manejando sua cadeira de rodas. “Afastamento do lar? Não. Deixa ele ficar. Ele é um homem bom, trabalhador, é que estava bêbado. São, não tem marido melhor. E ele prometeu que não bebe mais. Ele não tem para onde ir. Ele vai ficar triste.”

Não teve jeito. A lei determina. O Juiz manda. O Oficial cumpre. Foi para a casa da filha casada.
A mulher enfim concordou: ele precisava mesmo levar de um susto.

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